quarta-feira, 23 de janeiro de 2013

Eu amo a dança (e o triste caso de Sergei Filin)


Eu amo a dança. Disso meus amigos e minha família já sabem. A dança roubou minha alma quando era bem pequena. Eu nem tinha entrado no ballet quando a professora da primeira série pediu para a gente desenhar o que gostaria de ser quando crescer. Rabisquei duas coisas: uma bailarina e uma poetisa. Parece que previ meu futuro.

Mas, às vezes, amamos tanto uma coisa que num determinado momento precisamos nos afastar um pouco dela. Eu já tentei ficar bem longe. Não consigo. Continuo a fazer pliés, tendus e fouettes, embora meu corpo suplique por menos esforço. Então, a tática desenvolvida foi 'limitar' o tempo dedicado à dança para que ela não me consumisse tanto. Desse modo, tenho 'dosado' o ballet no meu dia a dia. Em parte por isso fiquei tanto tempo sem escrever aqui.

Tentarei agora cuidar melhor do blog, algo que também adoro fazer. Hoje, fiquei pensando na redação sobre o que poderia falar, qual post marcaria o meu retorno. Matutei e lembrei do assunto mais 'quente' (usando o jargão jornalístico) do momento: o ataque a Sergei Filin.

Como muitos devem saber, o diretor do Bolshoi e ex-bailarino, de 42 anos, foi atacado no dia 17 em Moscou. Um agressor encapuzado jogou ácido no rosto de Filin. Apesar de não correr risco de perder a visão, sua recuperação vai demorar pelo menos seis meses.

Ontem li a entrevista que a Folha de S. Paulo fez com a brasileira Mariana Gomes, que está há sete anos na Cia. O relato da brasileira assusta e comove. Ela menciona os vidros na sapatilha e as agulhas nos arranjos de cabelo. O pior é que, infelizmente, histórias desse tipo são mais comuns do que imaginamos. Um teatro pode esconder uma verdadeira selva com artistas capazes de fazer qualquer coisa para 'vencer'.

A arte, de modo geral, fomenta a vaidade e, por consequência, a inveja. Para piorar, a concorrência é gigantesca. Existe muita gente boa. Talento e esforço não bastam. Para ser bailarino entram na conta fatores complexos e subjetivos. Quem não lida bem com a derrota e com o sucesso alheio surta.

Parece exagero, mas há muitos anos digo que as meninas e meninos que desejam ser bailarinos e começam a trabalhar sério para isso deveriam receber acompanhamento psicológico. Como a própria Mariana falou, tem gente que vai parar em manicômio durante as turnês.

Quem já leu Dançando em Meu Túmulo, da norte-americana Gelsey Kirkland, sabe do que um bailarino é capaz para alcançar seus objetivos.

Muitos amigos me perguntaram: "Mas é daquele jeito que aparece no filme?", referindo-se a Cisne Negro. "Em muitos aspectos é. Tem gente que enlouquece mesmo", respondia.

Como pessoas cuja principal função é encantar plateias podem ser capazes de atos tão atrozes? Não sei. Só sei que existe muita coisa suja e errada na dança, assim como na política, no futebol e em tantas outras áreas. A arte não é imaculada.

A coisa já é feia nos festivais de dança. Nos concursos, em que a maioria dos participantes é adolescente, somem sapatilhas, figurinos, arranjos, maquiagens, além de dinheiro, celulares... Em cursos oferecidos nesses eventos há alunos que empurram, passam a perna, tomam a frente dos colegas de outras escolas sem o mínimo de educação. Não dá para esperar que esses mesmos jovens mudem seus hábitos quando se tornarem profissionais, dá?!

Enfim... É um ótimo assunto para discutir.

De todo modo, vamos torcer para que Filin se recupere logo e para que os artistas sejam mais éticos.

Abaixo o diretor do Bolshoi na variação de Don Quixote. Técnica impecável!


4 comentários:

  1. Concordo com exatamente tudo que você falou, tudo! Post incrível.

    Beijos, Geisa.

    www.arotinadeumabailarina.blogspot.com

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  2. Verdade nua e crua.. Infelizmente!

    Parabéns Ju!

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  3. Tudo isso me parece uma questão da humanidade... É grande a falta de ética e respeito consigo, com o outro e com a natureza. Os bailarinos tendem a se esquecer que é este mesmo corpo que levaremos até o fim de nossas vidas, e que se deixarmos de competir e sim cooperar, chegariamos todos a lugares inimagináveis... Ju é um lindo post, é pra se pensar....

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  4. Sempre ouvi de você e dos meus outros professores que a dança realmente é muito competitiva. Hoje consigo realmente acreditar quando se diz que tem bailarinos que são capazes de tudo pra estar sempre no auge! Uma pena pela imagem tão bonita que dança tem em cima dos palcos .. Estou lendo o livro 'Dançando em Meu Túmulo' a história de Gelsey realmente nos mostra até aonde tudo isso vai!

    Parabéns Ju adorei o post!

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